• Caetité, pequenina mas ilustre – Por Luzmar Oliveira

    30/04/2014 - 22:36


    CAETITÉ

    O Cinema de Maria Pinho

    Metade da década de quarenta. Havia em Caetité um homem chamado Guilherme Brandão de Castro.  Casado com Maria Pinho de Castro, com a qual teve sete filhos. Multiempresário, aquele homem resolveu trazer para aquela cidade algo que já fazia sucesso lá fora e seria inédito ali: Um cinema. O Cine Victória.

     

    O magnífico prédio do Teatro Centenário, já descrito por nós em outra ocasião, é a sede do empreendimento.

     

    A energia que iluminava a cidade era precária e não conseguia movimentar aquele projetor adquirido para o cinema. Instala-se, nos fundos do teatro, um motor de caminhão – Chevrolet – para, através de correias apropriadas, girar o gerador de alta voltagem e ciclagem adequada.

     

    Estava inaugurado o primeiro cinema de Caetité! Devido à vida agitada de Guilherme, piloto de avião, homem de várias atividades e negócios, o mesmo coloca o “Capitão da Pensão” como seu administrador e sócio gerente. E a parceria é vitoriosa, deu certo!

     

    O piloto trazia as fitas cinematográficas em seu avião. No início, filmes mudos. Legendados. Uma orquestra, talvez comandada pelo Capitão que também era músico, tocava ao lado da tela para alegria da platéia. Só depois de 1948 surgiram os filmes sonoros. 

    Apesar de transformado em cinema, o Teatro Centenário não perdeu a seu objetivo original, pois, em shows e peças teatrais suspendia-se a tela e os espetáculos eram apresentados com sucesso para a população.

     

    1950: Morre Guilherme de Castro. Eleições. Lauro de Freitas é candidato a governador da Bahia pelo PSD. 11 de setembro. Lauro e Gercino Coelho viajam com Guilherme de Bom Jesus da Lapa para Carinhanha. O avião cai e morrem os três. O partido substitui o candidato por Regis Pacheco que ganha as eleições. Mas em Caetité reinava o seu opositor, a UDN elege Ovídio Teixeira prefeito.

     

    A viúva Maria Pinho toma as rédeas dos negócios de Guilherme, inclusive do Cine Victória. Todavia sofre as perseguições do novo prefeito por motivos políticos. Adversários ferrenhos do piloto, eles rompem o contrato com sua viúva. Despejam o Cine Victória do Teatro Centenário.

     

    Começa o declínio daquele empreendimento. Sem o transporte aéreo, sem o marido, dona Maria, sofre com tantas perdas. Mas tem sete filhos para criar (perdera o oitavo com o susto pela morte trágica do marido). Não pode esmorecer. E vai à luta. Pressionada, recolhe seus equipamentos atirados em praça pública pelo prefeito. Com ajuda de amigos consegue guardar tudo. Acabou ai a primeira etapa do Cine Victória! Mas aquela mulher nunca desistiu! 

     

    1952. A empresa agora se chama Viúva Guilherme de Castro. E sua gestora é guerreira, destemida.

     

    1953. É inaugurado na Rua Barão de Caetité o novo Cine Vitória! Sucesso total! Prédio próprio construído por aquela fantástica mulher. Os filmes iam de trem até Brumado e de lá para Caetité através dos caminhões de carga e ônibus. E o cinema exibia um inédito a cada dia! Um salão com capacidade para 380 expectadores. Cerca de 200 pessoas o freqüentavam diariamente. E Caetité volta a se orgulhar de ter seu cinema!

     

    1954. O “Cinemascope” é novidade e faz sucesso. Técnica de projeção em tela alongada com foco triplicado horizontalmente, com outros benefícios tecnológicos, imagem em alta definição, som estereofônico e cores mais nítidas. E após consultas e acertos, dona Maria consegue trazer para Caetité essa maravilha. Alongou-se a sala, adaptou-se o ambiente, o telhado, o forro, as instalações elétricas e, após toda a metamorfose, a sala ficou pronta.

     

    1957. O Teatro Centenário volta a ser cinema. Desta feita, o Cine Caetité. Com o apoio dos políticos mandatários da cidade, o comerciante Sr. Zuza, conhecido milionário, consegue ser o novo concorrente da guerreira viúva. Mas o povo ganha com isso, pois passa a ter mais uma opção de lazer.

     

    1957. Terminadas as reformas. E a reinauguração deveria ser com a apresentação, sucesso no mundo todo, do filme O MANTO SAGRADO. Mas, com cópias limitadas, não estava disponível no momento. Então apresentam A VIUVA NEGRA. Mas logo em seguida chega o primeiro e mais DEMÉTRIOS, O GLADIADOR (os quais tive o prazer de assistir, pois eram livres).

     

    1959. Uma longa pane elétrica faz a cidade ficar as escuras por três meses. Dona Maria adquire, por sugestão do seu filho Marcelo, grupo gerador próprio para sua sala de espetáculos. E assim nasciam as matinês aos sábados e domingos. E nós conhecíamos então os desenhos da Disney.

     

    Ali estava a nossa diversão. Assistimos Casa Blanca, Sansão e Dalila, Cidadão Kane, E Assim Caminha a Humanidade, E o Vento Levou, Luzes da Cidade, A Doce Vida e um sem número de clássicos maravilhosos que nos levavam a sonhar.

     

    Jamais nos esqueceremos das músicas, principalmente de Billy Vaughn tocando Wheels e o jogo de luzes antes de começar o filme.

     

    1965 – Os filhos começam a ir para fora estudar. Praticamente só, dona Maria Pinho vende o Cine Vitória. E deixa Caetité.

     

    O cinema continua. Novos donos. Mas acaba aqui a nossa crônica. Numa homenagem a essa guerreira que não se deixou abater pela viuvez e nem pelas perseguições políticas. A esse homem extraordinário que, através do Prefeito Dacio Oliveira, teve seu nome reconhecido como herói e cidadão, emprestando-o ao Aeroporto local, totalmente reformado.

     

    Agradecemos a eles pelo Cine Vitória. Pelas matinês e noites maravilhosas que ali passamos. Parabéns aos seus herdeiros que tem tanta história para contar. E obrigada a Maria Amélia Castro por haver me proporcionado esta oportunidade presenteando-me com o livro de Marcelo Castro, UM CINEMA CHAMADO CINE VITÓRIA, de onde tirei as informações.

     

    E mais uma vez lembramos que Caetité foi pioneira em muitas coisas, porém, infelizmente, as querelas políticas destruíram inúmeras delas. Saudades de um Teatro magnífico trocado por uma agencia de um banco. De um Mercado colonial, substituído por um prédio qualquer. Que lutemos para não perdermos mais. Que corramos atrás das soluções e não das discussões. Que unamos forças e sabedoria para salvar o que ainda nos resta do Patrimônio Histórico da nossa Terra Mãe!

     

    Luzmar Oliveira

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