• Caetité, pequenina e ilustre – Por Luzmar Oliveira

    24/06/2015 - 14:03


    CAETITÉ

    Falando ainda das fogueiras...

     

    E hoje é 24 de junho, o dia de São João! O dia pós-fogueira e forró! Feriado no nordeste inteiro! Ressaca dos que curtiram o “Arraiá”! Dia de batata assada, café com chimango, cheiro de fumaça no ar. Nas ruas, restos das fogueiras e pouca gente. O céu cinzento nos mostra que o inverno chegou. Faz frio. O sol timidamente clareia o dia, mas o vento refresca o tempo. O silencio substitui o alarido dos fogos da noite anterior. Mas, de repente e não mais que... um ou outro estalo se faz ouvir. A meninada cata no chão o que perdeu ontem e, aproveitando as brasas meio mortas que se escondem nas cinzas, queimam umas bombinhas e traques. E São João acorda feliz!

     

    Há uma tradição que conta que ele, o dono do dia, dorme durante a véspera. É uma lenda que afirma que se o santo do carneirinho acordar durante as comemorações, o mundo acaba. E eu, menina, imaginava: Que sono pesado esse santo deve ter, pois, com tanto barulho, não consegue acordar... E se acordar? Vixe... O mundo vai pras “cucuias”!

     

    Manhã de 24 de junho... Qual a criança da minha época que nunca assou batata doce no borralho da fogueira na manhã seguinte à noite de São João? Era “um tal” de enterrar a danada, recobrir com cinzas e brasas e, com uma varinha ou um garfo, ficar, de dois em dois minutos, verificando se já estava boa. E com a casca sapecada, a retirávamos dali e, mesmo antes de esfriar, a partíamos ao meio, passávamos manteiga e a devorávamos inteira! Êta coisa deliciosa! Um verdadeiro banquete no café da manhã! A boca se enche de água só pela lembrança...

    Depois, com os olhos bem abertos, saíamos a procurar pelo chão os fogos perdidos na hora da folia. E encontrávamos traque, bombinhas e cobrinhas que alguém deixou cair. Era só alegria e muita farra. E juntando-os aos que sobraram, continuávamos a brincar e fazer barulho com nossos amigos. Era assim que não deixávamos a noite acabar, mesmo com o sol clareando o dia, mesmo com a fogueira apenas no borralho.

     

    E por falar em fogueira, também fazia parte da tradição reacende-la todas as noites seguintes, até que o último tição ou a última brasa virasse cinza. E assim o São João se misturava com São Pedro e quase também com o Dois de Julho. Só não com esse último porque era dia de outra festa, e a prefeitura preparava a cidade para as suas alegorias.

     

    Lá dentro de casa também havia a sobra das comidas. O frango e a leitoa estavam ainda mais gostosos, pois, em dia de pós-festa, nada é mais delicioso que comer o que restou no dia seguinte. E por mais tarde que tenhamos dormido, logo cedo despertávamos com uma sobrecarga imensa de energia. Não havia cama que nos segurasse. A vontade de continuar curtindo a melhor festa da nossa vida era a tônica de todos nós!

     

    Mesmo adolescentes éramos assim. A alegria das festas juninas sempre gritou alto em todos nós, sertanejos do meu nordeste. O zabumba, a sanfona, o triângulo... eles tem o dom de despertar uma coisa boa demais. E o forró é mais forte que o carnaval. É nosso! É como o baião. É invenção desse povo que, por mais sofrido que seja, tem a bondade e a alegria como refrãos da canção da vida. Tem no peito a vontade de sorrir, de dançar, de mostrar ao mundo inteiro que nasceu para ser feliz! Somos um povo que tem o xaxado no pé, o molejo na cintura, o ritmo da sanfona no coração. Êta gente diferente e colorida! Hospitaleira, recebe com um sorriso quem quer que seja, de onde venha e pede que fique à vontade. Que dance e coma sem cerimônia. Gente alegre e amiga como pouca ou quase nenhuma mais no mundo inteiro. Talvez o último povo feliz da Terra...

     

    Êta terrinha boa esse nordeste do meu Brasil. Êta cidade encantada aquela em que nasci e me criei. Na velha rua onde passei os vinte primeiros anos da minha atual existência, o São João era tradição e cor. Cada vizinho fazia a sua fogueira, mas sempre encontrava tempo para visitar a dos outros. E o bate-papo rolava solto, pois a convivência naquela pequena Caetité nos tornava uma grande família. E essa lei era para todas as ruas, todos os moradores. Não havia distinção entre pobre e rico, empregado e patrão, preto e branco, doutor ou analfabeto. Todo mundo era gente e era amigo. E todos festejavam juntos.

     

    E como esquecer tudo isso? E como não contar para os jovens de hoje que São João é tradição de alegria, boa hospitalidade e muito amor? É quando o nordeste mostra a que veio! Mostra que é a terra melhor do mundo e que seu povo é uma mistura de alegria e paz. Que temos o carnaval, o axé, o frevo... mas que mais que isso, temos na sanfona, na viola e no zabumba a nossa verdadeira história! Que o digam o velho Gonzagão, Dominguinhos e Sivuca, os eternos reis do baião!

     

    Luzmar Oliveira – [email protected]  – WhatsApp: 71 – 99503115  e 87247161. http:// facebook.com/luzmar.oliveira1

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